
NBD Brasília

Bruno conta;
Me expressar através das lentes mudou definitivamente a forma enxergar o mundo. Sou baiano, nasci em Feira de Santana. Teve um período na escola que eu trocava os livros pelas revistas de arquitetura que meus pais tinham em casa .
Aos oito anos de idade me mudei para Salvador, vejo claramente essa importância hoje em dia, a conexão sertão-mar. Durante o curso de arquitetura na UFBA, comprei minha primeira câmera e daí em diante a fotografia começou a se revelar de forma muito despretensiosa, só fui entender que poderia ser algo mais muito tempo depois.
Hoje, sigo fazendo projetos, cada vez menos, apenas para pessoas mais próximas, na indicação de boca em boca e quando sinto que o cliente está na mesma sintonia que a minha. A fotografia ocupou um espaço que na verdade abre alas para outros campos das artes, acho que estou longe de onde desejo chegar.
Bruno, você é arquiteto de formação, como surgiu a paixão pela fotografia?
Vamos fazer o seguinte... traga à memória lembranças de sua infância, lembranças de sua família, do primeiro lugar que viajou, do primeiro beijo, dos seus relacionamentos, o cheiro da terra molhada, a sensação do sol na pele, conseguiu visualizar? A paixão vem daí, ao fazer esse resgate você provavelmente gerou imagens aí dentro deste HD misterioso que possuímos.
A fotografia é uma das linguagens de como trazer isso à tona, foi o meio que encontrei de revelar meus pensamentos, minhas sensações, meu subconsciente. Há quem faça isso com as palavras, com o corpo, com tinta, com cerâmica, com sons, eu sigo usando uma câmera fotográfica, por enquanto. A pintura me seduz, preciso estudar mais essa linguagem.
Houve uma transição da arquitetura para a fotografia ou são atividades que se complementam em harmonia?
Acho que a faculdade de Arquitetura e de Belas Artes já tiveram um namoro interessante, é uma boa investigação a se fazer, os arquitetos filhos dessa época. Sinto que arquitetura é uma profissão mais dentro das convencionais que funciona como um portal para as demais áreas das artes, talvez isso explique a quantidade de artistas que já trilharam pela Arquitetura (risos).
Ainda não houve uma transição 100% para fotografia. Nossas experiências estão sempre nos complementando mesmo que não tenhamos noção racional disso. É importante ter gratidão pelo nosso passado, observar os caminhos que nos trouxeram até o determinado presente.
De que maneira as duas formas de criação se influenciam?
Visitando hoje as primeiras fotos que fiz, percebo que já tinha a noção de composição, jogo de luz e sombra, de volumes, perspectiva, já como influência da arquitetura. Fotografia aumentou minha curiosidade por pintura, por escultura, por valorizar ainda mais um mobiliário bem pensado, e nesse sentido consigo enxergar a arquitetura mais pura e funcional, pronta para receber obras de arte.
O Fine Art vem ganhando evidência no mercado de arte e cada vez mais espaço na arquitetura de interiores. Ao que você atribuiria esse crescimento e valorização da fotografia como obra de arte?
Você elege algum estilo que gosta mais de fotografar, que te define melhor?
Já me questionei muito à respeito disso. Olho de fora para dentro de mim e fico rindo sozinho de mim mesmo como sou complexo. Somos educados a nos definir como x, y ou z a todo o momento, mas nem todo mundo segue esse fluxo, nem todo mundo cabe dentro de uma caixa, tenho entendido que eu sou uma dessas pessoas, desconstruir isso é desgastante e ao mesmo tempo libertador.
Isso reflete positivamente na fotografia, meu gosto segue como a lua, fases rs… Ora estou buscando uma linguagem minimalista, ora me deparo com a complexidade de movimentos, cores e texturas, ora desejo uma luz mais suave que acalma , ora uma luz mais dramática. Vai muito do que eu estou sentindo no momento. Hoje tenho me conectado fotografando o homem de forma cada vez mais intimista, é emocionante. A natureza é perfeita, contemplativa, nos abraça, nos cura, o homem a violenta e ela manda um vírus para equilibrar o sistema, como se dissesse, abaixe a bola meu filho, quem manda aqui sou eu, respire fundo vá repensar suas atitudes rs. Cada cabeça é um mundo a ser explorado e isso é mágico.




Como é o processo de criação para uma série fotográfica?
Essa busca está no viver, nas reflexões, na leitura dos sonhos, no trilhar, nas viagens, nos filmes, nas músicas, no dia-a-dia, me observo , observo o próximo, observo o ser-humano , a natureza, suas relações e daí vou fotografando, registrando o que vejo , tenho um caderno que vou guardando os pensamentos que vem em mente. Deixo as fotos e as anotações guardadas, não vou logo pegando pra olhar e postar no instagram, essa velocidade digital me incomoda demais, as pessoas estão ficando doentes por conta disso, estão perdendo o sabor da vida. Sabe quando você faz um projeto, deixa ele dormir e depois olha com mais calma? Seguindo uma outra escala é quase essa sensação de colocar colírios nos olhos. Tenho em minha programação uma viagem para salinas no Rio grande do Norte, em paralelo percebi que já estive em mais três regiões com salinas, Atacama, Bolívia e Cabo Verde, somado a isso moro em Salvador, temos costume de nos banhar no mar para ´´lavar a alma“, ou tomar banho de sal grosso, deixar o sal espalhado pela casa para limpeza de energias. Perceba que cheguei ao sal analisando os lugares que já trilhei, onde estou e onde pretendo ir, e com minhas crenças, daqui surgirá um novo projeto. É importante analisar nossos movimentos inconscientes eles tem muito a dizer, claro que depois de captada a idéia, é preciso estruturar. Essa é uma das formas que faço, não é o certo nem o errado, é uma forma que encontrei. Estive pela primeira vez em São Luiz, MA em um Encontro Latino de Arquitetura, a primeira vez que pisei nos Lençóis Maranhenses, era Outubro e as lagoas estavam secas, havia pouca água, assim mesmo aquele lugar me reverberou paz, tranquilidade, me senti pisando nas nuvens, sabia que um dia voltaria lá, não imaginava que seria com uma câmera em mãos, quando estou naqueles dias agitados tenho vontade de me tele transportar para aquele paraíso. Interessante é que apesar de ter fotografado no período onde já havia mais água, as fotos que me conectei são mais áridas, tem o visual parecido da primeira vez que lá estive, os tons são seguem uma paleta de cores pastéis.

Fotógrafos costumam trabalhar em séries, o que te inspira para criar uma?
´´Deixe-me ir
Preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir pra não chorar
Se alguém por mim perguntar
Diga que eu só vou voltar
Depois que me encontrar”
Cartola
Acho que a inspiração vem daí, dessa busca, autoconhecimento.
Acredito muito no fluxo de energia entre as pessoas, busco me relacionar com quem está vibrando positivamente. Quando Alva me ligou para conversar à respeito do meu trabalho, fiquei logo admirado pela postura profissional, pelo respeito com o artista, e preocupação com os profissionais arquitetos e designers de interiores. A equipe da Divino também tem sido super atenciosa, acho que essa harmonia entre artista e galeria só tem a somar para melhor atender aos profissionais e clientes. Visitei uma Casa Cor de Brasília há cinco anos e fiquei admirado com a elegância dos espaços. A curadoria realizada pela Divino está ótima , pronta para atender as expectativas do público.



Quais os próximos projetos? O que podemos esperar do Bruno Ferrucio?
Há muitos pensamentos nesse caderno que comentei anteriormente. Hoje o que está mais presente é minha relação com o sertão, com os vaqueiros, há aí um longo caminho de estudos, tenho feito documental da pega-de-boi no mato, cada vez mais extinta, e seu entorno.
Por algum motivo, meus pensamentos me levam sempre à África. Moro em Salvador, cidade abraçada pelo mar e cidade mais negra fora da África, nasci no sertão baiano, quero mergulhar mais nesses aspectos, costurar essas relações ´´o sertão vai virar mar , o mar vai virar sertão’’ e como essa ponte pode chegar até a África.

